domingo, outubro 29, 2023

Ninguém nos conhece

 Ninguém sabe como nos tentaram calar a pontapé, as tantas vezes que fomos agredidos, sovados no corpo magro, puxados pelo cabelo e insultados. Ninguém sabe como fomos olhados com nojo, chamados de lixo e de velhos, de fezes e de escaravelhos. Ninguém sabe como ainda com a boca ensanguentada continuámos a sorrir calados, com a cabeça e os olhos subservientes. Ninguém sabe como ficámos ao abandono, corpo congelado e esfomeado ao relento. Ninguém sabe como vivíamos em terror, acossados, fugidios, a cada segundo com raiva e temor. Ninguém sabe que ficámos à beira do abismo e demos um passo atrás com toda a nossa força e teimosia, quando na verdade queríamos que o vento nos empurrasse de vez. Ninguém, ninguém, sabe o quanto fomos capazes e ninguém nos conhece jamais. 

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