quarta-feira, outubro 12, 2011

Alina, a modelo

A voz interior ausente,
perdida algures numa bagagem esquecida
na passadeira rolante do check-in do 1º aeroporto
e depois...

Intermitente, a existência de Alina que ía de vôo em hotel
e de hotel em vôo,
com as longas pernas alvas, de gazela albina fugidia,
em constante frenesim, mas sem desfilar cansaço.

Alina, a modelo, cujo corpo resplandecente
era transformado como o de uma boneca;
quase três pares de mãos lhe tocavam o rosto
e mais dois lhe percorriam o resto do corpo,
porque a perfeição nunca é atingida.

Por uma fracção de segundo, Alina olhou-se ao espelho,
por entre os corpos dos malabaristas que a tocavam,
e pensou: "tanto trabalho para me tornarem em algo diferente.
Sombras e pós, que num acto mágico aplicam uma máscara,
tudo tão falso e de certa forma doloroso...
e ainda assim é por esta aparência que as pessoas me invejam
e consequentemente me tratam mal
porque apenas vêem o que eu aparento."

A ideia de que todos a podem tocar, por ser Alina, a modelo,
 e a ideia de que será sempre intocável...

Porém, a sua altivez apenas é visível ao lado dos outros corpos
que insistem em tocá-la; esses artífices pequenos.
Ninguém a amará pelo que ela é, porque ela nada pode ser,
senão aquilo que cada um deles quer que ela seja;
a tela em branco para quem a olha imaginar o que quiser.

Alina é simples, nas suas linhas corporais e no seu discurso,
no entanto a sua existência está minada por complexas questões,
da maior parte das vezes abafadas pelos longos tecidos das roupas que tem de ostentar.

Alina, a modelo, será sempre bela e jovem como nas fotografias
que lhe tiram quase sem perguntarem.
A pressão é constante e os olhares e os apressados horários também não têm descanso.
Ela tem conhecido o mundo inteiro na suas viagens,
mas não há, no mundo inteiro, alguém que realmente a conheça
e viver assim torna-se demasiado solitário.
O síndroma de Marilyn Monroe não chega a persistir,
pois Alina desconhece que é só.
Todos o somos e não há mal nisso,
senão quando começamos a tomar consciência
e, então, não o sabemos aceitar.

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