sábado, outubro 30, 2021

Telefonema

 Hoje atendi o teu telefonema. Falei contigo mais do que tenho falado, dei por mim a queixar-me das minhas horríveis condições daqui de sempre e depois até parei por causa disso. Tu até que me ouviste bastante. Depois, ao perguntar-te se me conhecias bem, retirei logo a questão, porque de facto sempre mudei muito. Tu foste simpático, para variar até nem fizeste piadas e até me senti melhor porque lembrei de como todos sempre disseram que nunca tinham conhecido ninguém como eu, mas da maioria das vezes eu achava que isso era um defeito enquanto me elogiavam. 

Hoje aceito os elogios, agradeço até de volta, mesmo que às vezes ainda pareça a acidez de um vinho que não amadureceu ainda bastante a escorregar-me pela garganta mas a ficar na língua. 

O vento não parou de fazer barulho desde a madrugada passada a bater nas persianas. 

Eu gostei do telefonema, mesmo que tenhas falado dos chifres e pés de bode, para não dizer a resposta de "estavam tão perdidos que nem encontravam o rabo". Eu disse-te que ia publicar no Instagram e pôr o teu nome como autor, embora não tenhas Instagram, e que ia acrescentar "in Filosofias de Cu". 

É, esse telefonema pareceu normal.

Eu até agradeci teres ligado.

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